Aquela garota púbere excitava os velhacos do bar, os jovens das escadarias e até mesmo os homens de Deus não resistiam a seu alento. E aqueles seus olhos picantes que comem o olhar do homem, como o demônio que tenta Eva, em uma sedução sem pureza, exibem o escárnio da santidade. Eu, ao longe, observava sua graciosidade perversa imaginando as nossas incansáveis noites de fornicação, enquanto ela ia com suas colegas de colégio.
A jovem garota aproximou-se de mim. Suas pequenas mãos pálidas e aveludadas tocam-me a face febril, meu corpo todo estremece como quem não controla seus instintos, como um animal que cede sem moralidade aos desejos da carne. Tento evitar o fogo que se aflora em meu corpo, mas ela se aproxima cada vez mais.
Às vezes a vejo como àquela de Basílio, ou então Ema que, abusando do luxo e da luxúria, abre as pernas tão facilmente por achar que amando com os bichos está abrindo lacunas de diversão em sua pacata vidas. Porém, ela é diferente, é mais ardente, é mais profunda.
Como Blimunda a Baltasar, ela insistia no descompasso do relacionamento. Indagava, após motejar em meus ouvidos, com sua voz suave e dedicada as suas questões do amor:
- Não me fales do amor, pois sequer ele existe. O amor não tem cor, forma, sentido nem direção. O amor não é palpável, concreto... O amor não é visível, mas a alma o saboreia!
Sabia que não era certo envolver-me com Lola. Sou casado, velho e tenho filhos com a idade dela. Entretanto, ela é como o próprio diabo corrompendo-me a carne, dilacera meus valores e minha moral, pois necessita de meu corpo para celebrar a rebeldia.
Tentei deixá-la, mas a garota com quem deito nos leitos de motéis é como o ópio ao povo, ilude-nos a mente e nos domina pelo resto da vida, em uma simbiose de grande dependência.
Ao despí-la, sentia-me novamente aquele garoto travesso, cheio de aventuras. Não era como minha esposa, que me olhava com olhos cansados, esperando os últimos raios de sol. Lola era o sol, ao menos tão quente quanto ele. Nutrida pelo suor de nossa paixão, Lola emergia sons maviosos e plangentes, sonorizando o concúbito pecaminoso.
Há algum tempo atrás recebi um e-mail com o seguinte título: “Uma boa pergunta!”, que mostrava grandes personalidades negras do mundo, detalhe: nenhuma era brasileira, e no final do e-mail questionava a necessidade das cotas étnicas no Brasil, já que tantos negros como Obama e Oprah conseguiram se dar bem por que ter cotas? Será mesmo que é uma boa pergunta? Será mesmo que é tão difícil de compreender a necessidade de ações afirmativas nas universidades para tentarmos amenizar as desigualdades sociais?
Quantos dos negros mostrados no e-mail são brasileiros? Nenhum...
De qualquer forma, independente da nacionalidade, os negros ainda sofrem muito preconceito e discriminação.
É lógico que nós, "jafetitas", dominados pelas representações eurocêntricas, ainda somos muitas vezes vítimas de uma falsa noção de inclusão social. E é disso que se tratam as cotas! Não é uma simples limpeza de consciência ou então o pagamento de uma dívida, mas sim a responsabilidade do Estado em possibilitar o desenvolvimento da sociedade brasileira. Ninguém está acusando os afro-brasileiros de saberem menos, mas sim acusando a falta de estrutura que nosso país apresenta, em especial, na área de Educação que ainda é muito falha e oportunizando sim(!) o desnivelamento étnico e de classes.
Todos sabem que o ensino superior brasileiro ainda se caracteriza por pertencer à elite, tanto na cúpula administrativa das universidades, quanto nas salas de aula, por isso é muito importante que possamos debater a democratização do acesso e defender que cada vez mais estudantes possam entrar no ensino superior.
O negro, que teve seu desenvolvimento contido por centenas de anos, ainda é estigmatizado por nossa sociedade neoliberal e capitalista. Precisamos derrotar as barreiras da estupidez humana e acabar com a hipocrisia do "Brasil multicultural".
No e-mail apresentado foram mostrados alguns dos negros que se destacaram no mundo, mas e o resto? O homem mais rico do mundo é negro? O continente mais rico do mundo é negro? É fácil se utilizar alguns dados distorcidos para tentar impor a vontade da elite conservadora e racista brasileira!
Agora alguns dados:
1 - Do total dos universitários brasileiros, 97% são brancos, sobre 2% de negros e 1% de descendentes de orientais.
2 - Sobre 22 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha da pobreza, 70% deles são negros.
3 - Sobre 53 milhões de brasileiros que vivem na pobreza, 63% deles são negros.
4 - Segundo dados do MEC, o Brasil está em segundo lugar no que diz respeito a grandes populações afro-descendentes, perdendo apenas para a Nigéria.
Levando em consideração que METADE da população brasileira é negra, esses dados mostram como até hoje a abolição não se completou. Além disso, no Brasil foi necessária uma lei (a 11645/08, que reelaborou a 10639/03) para incluir os estudos africanos, afro-brasileiros e indígenas nas instituições de ensino brasileiras, e mesmo assim muitas escolas burlam a lei apresentando falsos relatórios de atividades. Poucas pessoas conhecem, mas há centenas de comunidades quilombolas que ainda não foram reconhecidas no Brasil, diversas delas estão sofrendo imensas batalhas, até mesmo com mortes, para a conquista da terra que as pertence. No Brasil só são propagadas as religiões cristãs, todas as religiões de matriz africana são vistas de modo negativo, especialmente aqui no Sul, fazendo com que não saibamos apreciar a rica cultura que é mantida nessas religiões.
É necessário que compreendamos que a escravidão do negro ainda não acabou em nosso país... Quando na abolição da escravatura, ao invés de educação ou terras, as famílias negras foram simplesmente despejadas nas ruas, aqueles que haviam construído absolutamente tudo no Brasil em quase 400 anos de exploração foram mandados embora sem receber nada, despejados nas ruas sem dinheiro, sem ter para onde ir, onde morar, o que comer, após séculos de escravidão e injustiças. Para trabalhar no seu lugar como assalariados foram trazidos milhares de trabalhadores brancos da Europa, que receberam apoio, ações afirmativas do Estado, e aos negros sempre foi negado, nesses quase 122 anos após aquela data, a igualdade de oportunidades. Por trás de execráveis rótulos racistas como os que falam em "Boa Aparência" (como se apenas pessoas brancas a possuíssem) os negros continuam sendo discriminados até hoje no mundo do trabalho e em todas as áreas.
O acesso a um ensino superior de qualidade é de extrema importância para o desenvolvimento de uma nação, porém, enquanto continuarmos com o dualismo de nossa educação e com a exclusão social jamais alcançaremos o progresso.
Nos últimos meses, Brasília está tendo um intenso debate pela aprovação da PL 5175, fazendo com que fiquemos cada vez mais perto de conquistarmos uma universidade mais democrática e de maior qualidade. A PL, que diz respeito ao projeto da Reforma Universitária prevê, dentre outros, a obrigatoriedade de cotas sociais e etnicas.
E ainda tem gente que diz que cota é preconceito...
Numa noite dessas, daquelas em que não se tem nada a fazer, eu estava dormindo no sofá da sala, quando, por peça do acaso, acordo e o som da TV ecoa em meus tímpanos. Era a voz de Pedro Bial, dizendo algo como: - Vamos fazer contato com os nossos heróis! Ele dizia aquilo com tanta empolgação que quase me convenceu de certo heroísmo, mentira, mas, instantaneamente, meu absurdômetro foi acionado, como pode alguém considerar como heróis um monte de jovens de classe média e média alta, que ficam dentro de uma casa sem precisar trabalhar, com direito a festas muito bem produzidas, piscina, academia, prêmios caríssimos e ainda um deles ganhar uma fortuna de um milhão e meio de reais?
Realmente essa questão começou a me intrigar muito, serão os heróis nacionais pessoas que simplesmente não contribuem em nada para nosso país? Será mesmo que os brasileiros e, principalmente, a nossa juventude consideram esses brothers como heróis? Francamente eu espero que não.
Afinal, quem são os verdadeiros heróis do Brasil? Não é uma pergunta a qual se responda tão facilmente. Seria o herói nacional aquele que fica em pé em cima de um tronco por algumas horas e ganha um carro ou aquele que fica em pé o dia todo cortando cana-de-açúcar e nunca terá um carro? Seria o herói nacional aquele que ganha milhões de reais somente por ser simpático e cativante ou aquela mulher de 45 anos que aceita, em meio ao desespero, qualquer emprego, pois é considerada velha na maioria das entrevistas? Teriam os heróis nacionais corpaços bem definidos ou seriam obesos que sofrem preconceito em qualquer lugar que vão? Sinto-me desconfortável quando começo a refletir sobre os problemas da futilidade humana, mas é necessário encarar.
Às vezes tenho a sensação de que heróis não existem mais, porém, o que são aqueles, que com apenas 15 anos de idade acordam às 5h da manhã para irem trabalhar como peões de obra durante o dia todo, senão heróis? E lá no Amazonas, o que são aqueles professores que passam horas dentro de uma jangada para levarem educação além das fronteiras, senão heróis? E o brasileiro que luta diariamente para não morrer de fome, o que é senão herói? E o que são os jovens das favelas que tentam mudar a realidade de suas comunidades, que tentam não seguir os passos da criminalidade, senão heróis? E cada um dos brasileiros que de uma forma ou de outra tenta melhorar a nossa nação, o que é? Não será um herói?
Há alguns meses me deparei com uma questão interessante... Um jovem senhor olhou para mim e disse: - No meu tempo os jovens admiravam Che Guevara, e hoje quem é o herói da juventude?
Bá! Eu desandei depois disso. Quem é o herói da juventude? Pus-me a pensar com afinco, mas nada foi produzido. Seriam Prestes e Zumbi? Cazuza e Renato? Ronaldo e Pato? Os bobos do programa Pânico e os tolos do BBB? Sinceramente, eu não soube o que responder. Calei-me e só.
Mas afinal, o que devemos esperar de um herói? Penso que não devemos ser idealistas, não devemos acreditar em um herói plano, como se diz na teoria literária, que será sempre o bonzinho, heróis devem ser humanos, esféricos, com diversos problemas, mas sempre dispostos a lutarem para conseguir superar o que está ruim. Esses, sim, serão os heróis.
Pensando nisso, lembrei que volta e meia recebo em minha caixa de e-mails um texto falando mal do Cazuza. Não quero defendê-lo, pois realmente só consigo admirar a música dele, mas dizer que não devemos admirar alguém porque esse alguém usava drogas soa-me um tanto quanto estranho. Sinceramente, sem fazer apologia a nada, o que é a juventude brasileira senão drogada? Quando digo drogada não quero simplesmente falar em maconha, cocaína... Quero falar dos problemas contemporâneos que entopem os jovens com drogas de tarja preta; quero falar das drogas intelectuais que a TV brasileira passa aos jovens diariamente; quero falar das drogas ideológicas que nos são impostas durante anos por uma educação alienadora; quero falar da pior de todas as drogas que é a vida sofrida no ciclo vicioso do capitalismo. É fácil atacar com falácias moralizantes, mas onde estão os heróis morais de hoje? Como querer exigir um herói moralista onde a moral já está misturada com a malandragem? Como querer exigir um herói correto quando o certo e o errado se confundem em novos conceitos de comportamento?
É, é sim, muito difícil de encontrar o herói nacional, mas, no fundo, no fundo, o gostinho de heroísmo deve ser provado por todos, por todos nós, brasileiros que, em nosso dia-a-dia, lutamos por nossas vidas, por nossos amigos e nossas famílias; que temos a esperança de um dia melhor assim que acordarmos; que conseguimos encarar a política mesquinha que se aflora cada vez mais; que, por menor que seja a contribuição, construímos um país melhor a cada passo que damos. O herói sou eu, o herói é você.
Para os sócio-históricos, o homem é um ser ativo, social e histórico, pois, a transformação da realidade humana é dependente do resultado do trabalho humano. O trabalho, como alteração da realidade objetiva (natureza e sociedade), é fundamental para os homens, através do trabalho é que se criam as condições existenciais da humanidade. O homem é um ser ativo, já que “a forma de intervenção do homem na realidade, produzindo sua sobrevivência, é ativa” (BOCK, 1999), as necessidades dos homens são supridas através das atividades, que devem ser constantes. Entretanto, como ser ativo, que necessita, pela atividade, produzir meios para suprir suas necessidades, o homem é, também, um ser social, uma vez que a determinação da atividade, ou seja, a forma de intervenção do homem na realidade, é realizada de acordo com a organização do trabalho em sociedade. O trabalho, enquanto meio de intervenção na natureza, só é possível em sociedade. Portanto, a sociedade é quem determina a forma e o jeito de como serão feitas as intervenções na realidade, de acordo com as necessidades humanas e a dinâmica cultural de cada sociedade. Além de ativo e social, o homem, na concepção sócio-histórica, é, ainda, um ser histórico. Isso porque se apropria e participa de um processo histórico para a produção dos bens que satisfazem suas necessidades. A atividade que transforma a realidade é um processo histórico. A modificação da natureza para a produção de bens necessários aos homens, resulta em novos parâmetros na relação entre homem e natureza, pois, a partir do momento em que produz bens que satisfazem suas necessidades, o homem depara-se com novas necessidades, que também serão supridas através da atividade humana. Como já foi dito, a forma de trabalho é determinada socialmente, através das relações sociais existentes, por isso, assim que existem novas necessidades que precisam ser satisfeitas, criam-se novas relações sociais que determinarão novas atividades na natureza, ou seja, é um processo histórico onde o homem, ao transformar a natureza, transforma a si próprio. Segundo a visão sócio-histórica do fenômeno psicológico, o homem é criado pelo próprio homem. Mais uma vez negando a existência da natureza humana, o processo que propicia ao homem determinadas aptidões é um processo inteiramente sócio-cultural. Segundo Bock, “a única aptidão do homem é poder desenvolver várias aptidões”, o homem conhece suas potencialidades e as maneiras de como pode agir quando entra em contato com a cultura. A transmissão dessa cultura, do conhecimento, o contato do ser humano com o mundo é feito através de um processo de educação. Para Vigotski, a consciência e as funções superiores se originam no espaço exterior, nas relações sociais. Para compreender a formação dessa consciência, Vigotski apresenta os signos, que são ferramentas que permitem realizar transformações nos outros. Então, através dos signos externos, principalmente a linguagem, é que se torna possível a construção das funções superiores. Bakhtin diz que a consciência só é possível por causa de um material flexível que consiga construí-la, que para ele é a linguagem. Pois então, a linguagem é a matéria-prima da consciência e, portanto, a consciência é sempre social.
domingo, 1 de novembro de 2009
Nesta semana que passou estive participando do I Simpósio Estadual de História e Cultura Afrobrasileira, Africana e Indígena, que foi realizado em Faxinal do Céu. A respeito disso, estarei escrevendo nos próximos dias alguns textos sobre os debates que tivemos.
Baticum
Enquanto rufavam os tambores do outro lado do mar, homens ambiciosos, desumanos, partiram armados para lá. Entre tiros e facadas das baionetas afiadas foi-se a tribo desarmada, acervar-se no porão, ressoam músicas, gemidos de tristeza, imaginando-se a certeza de não mais voltar ao seu torrão. O baticum cada vez mais distante, ao longe, perde-se o horizonte, como se perde a esperança de voltar. E entre açoites e correntes, necessário faz-se em suas mentes, ter coragem e força para lutar.
É fabuloso saber que ainda perdura, por mais insistência que exista em destruir isso, um espaço com liberdade. O mundo virtual se caracteriza hoje como o meio mais democrático que existe, não há "raça", religião ou "classe". Logicamente que na prática isso realmente não ocorre de maneira tão bela, porém podemos, ao menos, fingir estarmos livres por alguns instantes. Este espaço que tentarei manter será um refúgio para minha expressão, talvez falando sobre a linguagem, política, filosofia ou então sobre minhas experiências... porque não abrir às artes também? O que me for agradável e satisfazer meu id com certeza será exposto. Até breve.